[Livro] Stephen King, a biografia: Coração assombrado (2017)/ Lisa Rogak - Parte 2

 

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 “Há sempre o impulso de ver alguém que não seja você morto”, disse ele. “Esse impulso não muda porque a civilização ou a sociedade querem, ele está programado na psique humana, é uma necessidade perfeitamente humana de dizer ‘Estou ok’, e a maneira pela qual julgo isso é a de que essas pessoas não estão ok.”


Quando Steve trabalhou na fábrica da Worumbo Mills, ficou fascinado pelas hordas de ratos que circulavam o tempo todo no local. “Enquanto esperava que meu cesto enchesse, eu atirava latas nos ratos”, contou. “Eles eram grandalhões, e alguns deles ficavam de pé nas patas traseiras, pedindo comida como cachorros.”


Seu irmão, David, entrara na universidade anos antes. Quando os dois eram estudantes, Ruth mandava cinco dólares para cada um toda semana, a fim de que eles tivessem algum dinheiro para as despesas cotidianas. “Depois de sua morte, muitos anos depois, descobri que ela várias vezes deixou de fazer refeições para nos mandar aquele dinheiro, que nós aceitávamos sem pensar muito”, disse ele. “Foi muito perturbador.”


“Steve tinha um ponto de vista muito especial”, disse seu colega Michael Alpert. “Ele não acreditava nem um pouco no cânone oficial – o currículo de Harvard. Para ele, muitos dos autores mais populares tinham mais a dizer. Ele não se referia apenas ao tema, mas à linguagem. Sua sensibilidade já estava formada naquela época.”


“Ele era uma dessas pessoas que não conseguem passar despercebidas”, disse MacLeod, contando como Steve era alto mas estava sempre tentando disfarçar sua altura ficando ligeiramente curvado. Também era difícil não notar seu cabelo preto, longo e oleoso, chegando aos ombros, seus óculos de fundo de garrafa e sua maneira desleixada de se vestir. “Ele sentava na borda do círculo, pigarreando e fazendo comentários sobre um poema ou o que os outros estudantes estavam dizendo”, acrescentou MacLeod. “Ele sempre tinha uma opinião diferente, raramente concordando com o grupo. Ele gostava de discutir com as pessoas só para ser diferente.”


Mais tarde, Steve daria detalhes sobre seu consumo de drogas nos anos da universidade. “Tomei um bocado de LSD, peiote e mescalina, mais de sessenta viagens ao todo”, ele disse. “Nunca tentei converter ninguém para o ácido ou outras drogas alucinógenas, porque algumas pessoas encaram bem as viagens, outras têm uma viagem ruim, e esta última categoria pode sofrer sérios danos emocionais.”


“A literatura deve ser algo tórrido e próximo”, disse. “Quero que ela alcance a pessoa, agarre-a e a prenda em um abraço ardente, sem deixá-la partir. Sempre busquei machucar o leitor e, ao mesmo tempo, diverti-lo. Acho que um livro deve ser uma coisa realmente viva e perigosa, em várias maneiras.”


Na coluna de 18 de dezembro de 1969, ele escreveu: “Talvez haja um buraco em nosso mundo, talvez no tecido de nosso Universo, pelo qual as Coisas vêm e vão. Pode ser que em algum outro mundo todos os nossos antigos bichos-papões existam, andem e falem – e ocasionalmente se percam em nossa esfera”.


Como professor de inglês do ensino médio, ele estava finalmente colocando em uso seu diploma de graduação, apesar de rapidamente descobrir que ensinar não era aquilo que imaginara. “Eu pensava que dar aulas me garantiria uma vida de classe média, não imaginava que fosse significar pobreza”, afirmou. “Ser professor do ensino médio é como ter cabos para bateria conectados nas suas orelhas, sugando toda a energia que há em você. Você chega em casa, tem provas para corrigir e fica sem vontade de escrever. Pretendíamos ter um carro, esperava-se que fôssemos ter uma vida decente, mas estávamos piores do que quando eu trabalhava na lavanderia.”


“Comecei a beber demais e a jogar dinheiro fora com pôquer e sinuca. É a clássica cena: é sexta-feira à noite, você desconta o cheque do pagamento da semana no bar e começa a virar, e, quando se dá conta, já se foi metade do orçamento semanal para comprar comida. Para mim, o objetivo era sempre ficar tão chapado quanto possível. Nunca entendi o que chamam de beber socialmente, para mim parecia com beijar sua irmã. Até hoje não consigo imaginar por que alguém quer beber apenas socialmente.”


“Normalmente não descrevo os personagens sobre os quais escrevo porque não acho necessário”, disse. “Se os leitores pensarem neles como pessoas de verdade, colocarão neles o rosto que desejarem.

 
“Eu havia escrito O Iluminado sem perceber que estava escrevendo sobre mim mesmo”, disse. “Nunca fui a pessoa mais autoanalítica do mundo. As pessoas sempre me pedem para analisar o significado de minhas histórias, para relacioná-las com a minha vida. Ainda que eu nunca tenha negado que elas... têm alguma relação com a minha vida, eu sempre fico perplexo quando me dou conta, anos mais tarde, de que de alguma maneira eu estava delineando meus próprios problemas e, de certa forma, me autopsicanalisando.”


“O dinheiro deixa você um pouco mais são”, disse. “Você não tem de fazer coisas que não quer.”


“Basicamente, o que faço é falar coisas que as outras pessoas têm medo de dizer. Esse trabalho não é muito diferente do de um autor de comédias. Do que é que ninguém quer falar, o equivalente a pegar um garfo e arranhar um quadro-negro com ele, ou fazer com que alguém morda um limão? Quando descubro que coisa é essa, geralmente a reação dos leitores ou espectadores é ‘Obrigado por dizer isso, por articular esse pensamento’”.


“Amo o fogo, amo a destruição. É sensacional, é sinistro e é excitante. A Dança da Morte me trouxe muita satisfação porque nele tive uma chance de remover a raça humana, e uau, foi divertido! Boa parte do sentimento compulsivo e de urgência que tive enquanto trabalhava em A Dança da Morte vinha da emoção de imaginar toda uma ordem social estabelecida destruída de um só golpe. É a faceta de bombardeador maluco da minha personalidade, suponho.”


“Há algumas coisas que faço quando sento para escrever”, explicou. “Eu pego um copo de água e uma xícara de chá. Há um horário certo para sentar, entre oito e oito e meia, em algum momento desse intervalo de meia hora todas as manhãs. Tenho minhas vitaminas e minha música, sento na mesma cadeira, e os papéis ficam dispostos nos mesmos lugares. O objetivo é fazer as coisas da mesma maneira todas as manhãs, é dizer para a mente ‘Você estará sonhando em breve’.” “Não é diferente da rotina para dormir. Você vai para a cama de um jeito diferente toda noite? Há um lado da cama no qual você dorme? Quero dizer, normalmente escovo meus dentes, lavo minhas mãos. Por que alguém lavaria suas mãos antes de se deitar? Não sei. E os travesseiros têm de estar em uma determinada posição. O lado aberto da fronha tem de estar voltado para dentro, para o outro lado da cama. Não sei por quê.”


2 comentários:

  1. Eu já gostei mais do Stephen King, li bastante lá pelos meus 16~17 anos. Os que mais gostei foram "A Coisa", "o cemitério", "A zona morta" e o "À Espera de um Milagre".
    Acho que no geral os melhores livros do King são os que não são de terror, por incrível que pareça, e acho que ele peca por não conseguir terminar muito bem suas histórias (O começo geralmente é fantástico, e o meio também é bom - para mim o maior exemplo disso é A Coisa, cujo final no livro julguei bem fraco em comparação com o restante do livro, e o A Dança da Morte tem um final bem tosco, na minha opinião, embora 99% do livro seja eletrizante).
    A série da Torre Negra é bem estilo ame ou odeie, e eu só aguentei ler até o 5o volume... Não gostei, achei bem bobinha, parece que ele juntou um monte de ideias que sozinhas não fariam livros e resolveu montar a colcha de retalhos na Torre Negra.

    Hoje em dia eu leio mais H.P Lovecraft.

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    1. depois de tantas obras publicadas deve ser difícil continuar fazendo finais criativos e interessantes

      li bastante Lovecraft quando era mais novo e se tiver tempo um dia vou reler

      Torre negra ainda vou conferir - tentei ler a versão em quadrinhos, mas me pareceu um pouco cansativo

      abs!

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Memento mori...carpe diem!