[Livro] Aprendendo a Viver (65 d.C.)/Sêneca - Parte 3

 





· Tudo isso faz parte do percurso de uma longa vida, como a poeira, a lama e a chuva durante uma viagem.





· Tudo o que vem da riqueza não gera frutos, não proporciona satisfação, se o possuidor não possuí a si próprio e não toma posse do que lhe pertence. É uma tolice, Lucílio, pensar que a riqueza pode nos fazer algum bem ou mal; ela apenas fornece material para os nossos bens e nossos males; os elementos daquilo que juntos a nós poderá se desenvolver em bem ou em mal. Bem mais poderosa que a fortuna é nossa alma. Para o melhor ou o pior, é ela quem conduz os nossos destinos, é ela a responsável pela nossa felicidade ou miséria.





· Desprezível é a alma obcecada pelo futuro, é infeliz antes da infelicidade, deseja ter para sempre as coisas que lhe causam prazer. Não terá descanso, e a necessidade de querer conhecer o futuro lhe fará deixar de lado o presente que poderia ser melhor desfrutado. Temer a perda de algo é o mesmo que já não tê-lo mais consigo.

Não pensa que eu sou a favor da indiferença. Foge dos perigos. Fica atento a tudo que pode ser previsto. o que for que ameaça, não espera que te atinja, passa longe. Nessa situação, a confiança em ti e o firme propósito de tudo suportar serão muito importantes.







· Para minimizar os efeitos dessa perda, de que dispomos? De guardar a lembrança do perdido e, assim, não deixar desvanecer o que de proveito se tenha tido com o que se foi. Se a posse vai embora, fica para sempre o privilégio de ter possuído. Muito ingrato é aquele que, quando não tem mais nada, imagina nada dever por aquilo que tenha recebido. A sorte tira o objeto, mas deixa o fruto que nossas queixas nos fazem perder.



· Enfim, é estúpido lamentar-se da saudade, já que o espaço que separa aquele que se perdeu daquele que o deseja é mínimo. Precisamos ter a certeza na alma de que seguiremos aqueles que perdemos.





· Ninguém deveria fazer promessas para o futuro. Mesmo que já possuímos pode nos escapar e, nessa hora, que pensamos estar bem, um mal pode nos arrasar. O tempo transcorre segundo leis imutáveis, é certo, mas obscuras. E que me importam as certezas da natureza se eu permaneço na incerteza?



· Em verdade, só se concentram no futuro aqueles que estão insatisfeitos com o presente. Ao contrário, se eu estiver satisfeito com o que tenho, quando a mente souber que não existe diferença entre um dia , a alma visualizará, do alto, o conjunto dos dias e dos acontecimentos que estão por vire apenas sorrirá. De que maneira a inconstância e a mudança do acaso podem perturbar aquele que permanece estável na instabilidade?





· Quem vive na esperança do amanhã deixa escapar o presente. Assim, se aproxima de um desejo insaciável acompanhado de um sentimento miserável que torna as coisas mais miseráveis, ou seja, o pavor da morte.



· A natureza despoja tanto quem entra quanto quem sai.



Não te é permitido levar mais do que tens, e até o que trouxeste para a vida ao nascer aqui deverá ser deixado. Perderás a pele, o mais superficial de teus envoltórios; perderás a carne e o sangue que corre pelo teu corpo; perderás ossos e os nervos, aquilo que sustenta as partes informes e flácidas de teu corpo.

Esse dia que temes como ultimo será o de teu nascimento para a eternidade. Deposita o teu fardo.





· Mesmo a paz te causará temor. Uma mente perturbada não confiará nem mesmo nos fatos mais óbvios, pois o sentimento incontrolável do medo, que ela sempre sofre, acaba por torna-la totalmente insegura.



· O campo de toda a atividade deve ser o estudo, e no meio dos sábios, para relembrar a verdades adquiridas e para descobrir novas. Assim, é dever retirar a alma de sua terrível escuridão, libertá-la. Enquanto ignorares o que deve ser evitado e deve ser procurado, o que é imprescindível e o que é supérfluo, o que é justo e o que é injusto, o que é honesto e o que não é honesto, jamais viajarás , será apenas um errante.





· Não há, com certeza, nenhuma diferença, Lucílio, entre não desejar e possuir. Nos dois casos, o resultado é idêntico, isto é, não há sofrimento. Também não te recomendo que negues algo à natureza – ela é contumaz, não pode ser vencida e reclama o que lhe pertence - , mas que saibas que o excedente na natureza, longe de ser indispensável, apenas está a nosso dispor como algo a mais, não imprescindível.



· O que preferes: ter muito ou ter apenas o suficiente? Aquele que tem muito deseja ter mais, o que prova não ser suficiente o que já possui. Aquele que possui o suficiente obteve o que o rico jamais poderá atingir, ou seja, o fim de seus desejos.



· Jamais é pouco o suficiente, jamais é muito o que não satisfaz.





· O dinheiro nunca tornou alguém rico; ao contrário, sempre causou mais cobiça. Queres saber por quê? É porque quem mais tem mais quer ter.



· Avalia todas as coisas pelos desejos naturais, aqueles que podem ser satisfeitos de graça ou por pouco preço; jamais confunde os vícios com desejos.



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