28 outubro, 2021

[Guest post] A vida de Julia (2021)

 


Jovens oprimidos pelo sistema pequeno burguês.

Imagem por Vincent Rosenblatt

Julia me divertiu há alguns anos. Ela foi personagem de campanha de Barack Obama. Quem quiser, pode pesquisar a respeito. Basicamente, tratava-se de uma garota aparentemente nascida do nada (geração espontânea?). Era uma espécie de história em quadrinhos com infográficos onde a personagem teve o Estado ao seu lado em todas as fases de sua vida. Julia não tinha pais, avós, ninguém: somente Obama. Ela quis estudar e, sob o Governo Obama, conseguiu. Ela procurou emprego e Obama lhe deu. Ela quis ter filhos: Obama foi lá e créu. Se quisesse abortar, o governo também ajudaria na matança. Ela queria coisas grátis e espaços em cargos, empregos e universidade. Obama estava ali para isso.

Poderia haver alguma propaganda política similar por aqui. Júlia teria cinco irmãos de pais diferentes. Alguns de seus irmãos, a mãe de Júlia não saberia sequer quem é o pai. O pai de Júlia, por sua vez, seria bebum, pai de mais dez filhos por aí, com diversas mulheres diferentes. Seus dias seriam à mesa de bar, coçando o saco, tomando uma, falando merda e pegando putas quando os auxílios públicos caem na conta. Júlia é filha de procriadores irresponsáveis, que entopem o planeta de gente para proliferar a miséria em troca de benefícios sociais e discursos vitimistas.

Júlia recebe tudo em sua escola: "lápis, caneta, borracha, cadernos, livros, uniforme (se provar que não pode comprar), passe de ônibus grátis" etc., seus "pais ficam desobrigados de trabalhar para pagar pelos materiais do filho" (v. A Marreta do Azarão). Mas ela nunca abriu um livro sequer na vida e estudar lhe causa sono. Em sua casa, todos passam os dias coçando as beiradas e vendo TV (gato de energia elétrica e internet comunitária). À noite, ganham o mundo: baile na comunidade, beques, pinos de pó com os parças e trepadinhas sob as estrelas, irresponsavelmente, procriando ainda mais (mesmo que a unidade de saúde local tenha preservativos e anticoncepcionais gratuitos). Todos andam "bem" vestidos, com roupas de marca e iPhone. Até porque uma calça para uma jovem de dezesseis anos é mais de trezentos reais.

Júlia teria ótima recepção em propagandas políticas. Seria uma aguerrida garota da favela: parda, bissexual, vítima de todo o sistema opressor que lhe tolhe os sonhos mais belos e não permitiu que ela se tornasse médica. Julia não é feliz porque você, pequeno burguês (leia-se: um merda de assalariado que rala todos os dias da semana para pagar impostos), não permitiu. E se você for homem e branco, sua dívida é maior.

Estou cansado de ser responsável por Julia. Nunca lhe comi a mãe e preciso trabalhar para custear minhas contas.

Andei pensando bastante em Julia (e nas Júlias) estes dias.

Abraços.


4 comentários:

  1. Olá, Scant.
    Grato pelo post!
    Abraços!

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  2. Belo retrato da realidade. Lembro que há alguns anos peguei um táxi e, logo de cara, o taxista puxou assunto e ficou se gabando, feliz da vida, de como não pagava conta de luz e nem internet onde ele morava porque era tudo gato. Fingi que tinha esquecido alguma coisa e pedi pra saltar na hora. Sempre que posso, procuro evitar dar dinheiro para ladrões.

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    1. no Brasil, o absurdo é lugar-comum
      tive um colega servidor público que ganhava bem (4000-500k/Mes) e que vivia numa comunidade (não pagava água, luz acho que tinha gato etc) para economizar dinheiro e comprar uma casa própria

      abs!

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